quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Presente, sempre

O ego não é mais do que a sensação de localização e apropriação dos conteúdos residentes na memória.
É quase impossível de se mover mentalmente após ler esta frase de Sesha.
O presente é o ambiente no qual tudo o que se sucede acontece. O presente é a chave mestra que pode nos abrir a porta da compreensão, do discernimento real. E o mais belo de tudo é que no Presente o ego não existe. Vejamos novamente a frase inicial.
Toda a nossa imensa fundação subterramentalemocional que sustenta a ilusão de um agente (o “eu”) diferenciado do que acontece em nossa volta é construída a partir deste simples – porém de consequências imensas – ato: a sensação de localização e apropriação dos conteúdos da memória.
Nosso dia a dia é uma repetição interminável do ato de matar o presente e voltar para a memória. Senão vejamos: quando vivemos uma nova experiência é possível que sintamos aquela sensação de surpresa (e presença), por exemplo, quando nos deparamos com uma linda paisagem. No instante seguinte matamos o presente ao “etiquetar” a experiência; por exemplo, podemos pensar “que linda esta paisagem que estou observando”. Este pensamento denota que o processo de etiquetagem da experiência, e armazenamento na memória, já ocorreu. Ou seja, já não se está vivendo o presente, mas sim a memória.
Este rapidíssimo processo introduz um viés de diferenciação na percepção do mundo. Por mais sutil que possa parecer, há uma sensação de posse do ocorrido, e esta sensação é o “eu” - sem esta sensação de posse da memória, não há “eu”. De fato, no instante mesmo da surpresa com a paisagem não havia “eu”. Ele só aparece no instante seguinte, quando se dá o processo de etiquetagem e armazenamento. O Vedanta Advaita denomina este processo de nama e rupa (nome e forma).
Se conseguirmos nos treinar a buscar no presente o que as coisas são sem atribuir nome e forma – ou seja, sem o peso da posse mental-emocional sobre a realidade – conseguiremos começar a compreender que não somos diferentes daquilo mesmo que acontece. Muitas práticas simples podem nos ajudar; a mais fácil é escolher um objeto e observá-lo em cada pequeno detalhe, mas sem atribuir-lhe qualquer definição previamente existente em sua mente (pois se assim o–fizer você não estará no presente, mas na sua própria memória). Continue observando o objeto, e perceba como a sensação muda quando você vê o objeto a partir dele mesmo, e não a partir de sua memória. Esta sensação é a porta de entrada do presente. Este é um exemplo de prática de meditação externa.
A contínua prática de se viver no presente naturalmente nos mostra que existem outros agentes de percepção que não o “eu”, presentes em estados de consciência superiores do ponto de vista de discernimento da Realidade.
Sem a sombra e o cheiro encharcado da constante apropriação das ações que acontecem no presente pelo insaciável ego há uma trilha infindável de uma leveza e liberdade que talvez nem consigamos suspeitar.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Domingos de meditação

Neste segundo semestre o Instituto Brahmavidya, coordenado pelo Eloi, estará fazendo encontros mensais de meditação aos domingos.
Para aqueles que gostariam de conhecer um pouco melhor a simplicidade e profundidade da filosofia e da prática Vedanta Advaita (tema de fundo deste blog), e para aqueles que sempre quiseram praticar mas tem dificuldade de encontrar o tempo e a disciplina, esta é uma grande oportunidade.

Instituto Brahmavidya
Vedanta Advaita Sesha


ENCONTROS DE MEDITAÇÃO INTERNA
“SER SILÊNCIO”

UM DOMINGO AO MÊS AS 07H3O
DIAS: 15/02, 15/03, 12/04, 10/05, 07/06, 12/07, 09/08, 06/09, 04/10, 08/11, 06/12.
Obs: Não será permitido entrar após as 07h30.
Coordenação: Eloi Campos (9101-9086)
Rua Indiana, 1403, Brooklin (5506-5220)

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Sobre homens e ratos

Hoje acordei às 5:20h. Me levantei da cama e me sentei na almofada do quarto ao lado para praticar. Me cobri com um cobertor, ajustei a posição das pernas, fechei os olhos. Às 6:15 o despertador tocou novamente. Me levantei e fui tomar um banho rápido. Me vesti e fui buscar os meninos para levá-los à escola. Conversamos no caminho – entre jogos de celular e músicas no i-pod e os deixei na portaria. Mais meia hora de trânsito e cheguei ao trabalho. Seis horas depois fui almoçar. Na saída do restaurante carros de bombeiro e um pequeno incêndio no prédio vizinho. Mais seis horas e estou escrevendo alguma coisa, no que parece ser o instante presente. Depois voltarei para casa, para tomar outro banho, comer alguma coisa, deitar e, após algum tempo, dormir. Ou algo assim. Posso viver mais dez anos (ou vinte) deste modo. Mas como estou de fato vivendo? O que foi real neste dia? Quantos instantes de presença?
Posso rechear as horas e os minutos com centenas de emoções e pensamentos, mas nada disso importaria. Como os romances de trezentas páginas - lençóis encharcados de emoção. Afinal, precisamos nos distrair. Sem consciência e presença só nos resta a opção da distração... Nós não conseguimos sequer alguns minutos de concentração e paz mental, como poderíamos sobreviver a um dia de paz? De fato não conseguimos, de certo modo não estamos prontos. E de certo modo – segundo dizem os mestres – estamos sempre prontos, já que a ignorância é absolutamente ilusória. Enquanto nadamos nesta lagoa de ignorância a alternativa para manutenção da sanidade (??) é a distração. E assim trabalhamos, amamos, brigamos, vivemos e morremos – tudo distração, porque não suportamos sustentar a presença por mais que alguns segundos. Não suportamos nos desapegar de nossos mais rasos medos, de nossos vícios emocionais com nossos parceiros, de nossas tão amadas e bem construídas imagens. Não concebemos ser possível um dia sem uma troca, uma negociação emocional implícita entre eu e os outros – seja mulher, marido, filhos, colegas, chefes, garçons... Não concebemos ser livres. Assim resta a distração – que cumpre bem o papel da descompressão. Assim podemos manter a razão...
Dizia Nisargadatta: “ mantenha-se no centro; quando você caminha através de uma multidão você não luta com cada pessoa que passa, você encontra seu caminho por entre elas. Assim devemos fazer em nossa prática ou em nosso dia a dia quando percebemos as emoções e pensamentos se aproximando.”
Este tipo de liberdade que parece quase inverossímil é a única realidade. Assim posso rever meu dia, e vejo que passei por muitas multidões; muitas vezes lutei sem perceber, e em outras achei um modo de permanecer no centro. Assim espero o próximo dia, e minha única expectativa é não esquecer de lembrar disto.