segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Sobre homens e ratos

Hoje acordei às 5:20h. Me levantei da cama e me sentei na almofada do quarto ao lado para praticar. Me cobri com um cobertor, ajustei a posição das pernas, fechei os olhos. Às 6:15 o despertador tocou novamente. Me levantei e fui tomar um banho rápido. Me vesti e fui buscar os meninos para levá-los à escola. Conversamos no caminho – entre jogos de celular e músicas no i-pod e os deixei na portaria. Mais meia hora de trânsito e cheguei ao trabalho. Seis horas depois fui almoçar. Na saída do restaurante carros de bombeiro e um pequeno incêndio no prédio vizinho. Mais seis horas e estou escrevendo alguma coisa, no que parece ser o instante presente. Depois voltarei para casa, para tomar outro banho, comer alguma coisa, deitar e, após algum tempo, dormir. Ou algo assim. Posso viver mais dez anos (ou vinte) deste modo. Mas como estou de fato vivendo? O que foi real neste dia? Quantos instantes de presença?
Posso rechear as horas e os minutos com centenas de emoções e pensamentos, mas nada disso importaria. Como os romances de trezentas páginas - lençóis encharcados de emoção. Afinal, precisamos nos distrair. Sem consciência e presença só nos resta a opção da distração... Nós não conseguimos sequer alguns minutos de concentração e paz mental, como poderíamos sobreviver a um dia de paz? De fato não conseguimos, de certo modo não estamos prontos. E de certo modo – segundo dizem os mestres – estamos sempre prontos, já que a ignorância é absolutamente ilusória. Enquanto nadamos nesta lagoa de ignorância a alternativa para manutenção da sanidade (??) é a distração. E assim trabalhamos, amamos, brigamos, vivemos e morremos – tudo distração, porque não suportamos sustentar a presença por mais que alguns segundos. Não suportamos nos desapegar de nossos mais rasos medos, de nossos vícios emocionais com nossos parceiros, de nossas tão amadas e bem construídas imagens. Não concebemos ser possível um dia sem uma troca, uma negociação emocional implícita entre eu e os outros – seja mulher, marido, filhos, colegas, chefes, garçons... Não concebemos ser livres. Assim resta a distração – que cumpre bem o papel da descompressão. Assim podemos manter a razão...
Dizia Nisargadatta: “ mantenha-se no centro; quando você caminha através de uma multidão você não luta com cada pessoa que passa, você encontra seu caminho por entre elas. Assim devemos fazer em nossa prática ou em nosso dia a dia quando percebemos as emoções e pensamentos se aproximando.”
Este tipo de liberdade que parece quase inverossímil é a única realidade. Assim posso rever meu dia, e vejo que passei por muitas multidões; muitas vezes lutei sem perceber, e em outras achei um modo de permanecer no centro. Assim espero o próximo dia, e minha única expectativa é não esquecer de lembrar disto.

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