terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

limites

Ontem conversava com uma amiga sobre a prática de meditação.
Ela me explicava que tentava praticar o silêncio, mas era difícil aguentar os 15 minutos que tínhamos combinado, então resolveu seguir tentando com 10 minutos, porquê “... assim eu conseguiria me concentrar mais nestes 10 minutos, e fazer uma boa prática, o que seria melhor que ficar 15 minutos menos concentrada...”. Quantas vezes eu já não pensei algo assim, e quantas outras ouvi de tantas outras pessoas.
Esta é só mais uma armadilha, uma das desculpas que encontramos para não seguir um pouco além do que parecem ser nossos limites. O que define seu limite? Por definição o limite não pode ser pensado... precisa ser experimentado.
Quem constrói as armadilhas? Quem conhece você melhor do que você mesmo, e assim monta a desculpa mais perfeita para convencer você mesmo de que já é hora de parar, ou de que hoje não é um bom dia para praticar, afinal estou cansado, afinal tenho que arrumar minhas coisas, afinal preciso ler este material para amanhã, afinal acho que não preciso disso hoje, afinal qualquer outra desculpa.
O dia tem 24 horas, e talvez em 17 destas você está em vigília (isto, é não está dormindo deitado, porque é bem capaz de estar dormindo acordado). Uma semana tem 7 dias, ou seja, 7x17 horas de vigília. Isto resulta em 119 horas na semana. São 7.140 minutos.
Digamos que você se proponha a praticar 3 vezes por semana, por 15 minutos. São 45 minutos na semana. 45 minutos de prática em 7.140 minutos de vigília: isto equivale a 0,6% ( ou 1/150) .
Quanto você dá de gorjeta ao garçon em um restaurante? 10%? Se você desse 2% de gorjeta para sua alma, para sua busca, você praticaria pelo menos 140 minutos na semana... ou 3 sessões de 45 minutos, ou 5 sessões de 25.
Parece muito pouco 15 minutos em um dia, mas na prática isto pode se tornar difícil. Sim, é preciso disciplina; mas é preciso muito mais interesse, curiosidade, inquietação e vontade. Não se pode esquecer que é a personalidade (o “eu”) quem desenha e projeta nossos ilusórios limites, nossas imensas desculpas. O “eu” tem um verdadeiro escritório de arquitetura e engenharia para projetar nossos edifícios de ilusão. O financiamento deste escritório é feito na moeda “hábitos de pensamentos”, que é produzida aos bilhões em nossa interminável agitação mental. Só quando se aquieta a agitação mental é que a Consciência – que acolhe o “eu” em sua ilusoriedade (Maya) – e que eterna e onipresentemente conhece a si mesma, se revela em todo o seu brilho.

3 comentários:

Anônimo disse...

Thiele,
Merecemos muito esta gorjeta !! O interesse é maior que a disciplina, até por que a disciplina vem muitas vezes comandada pelo escritório de arquitetura e engenharia. Talvez a primeira chamada interna provocando algo como "Não vai fazer a prática hoje ?" venha mais próximo do que nós somos, e não do escritório. Os “hábitos de pensamentos” turbinam as mil desculpas prováveis, mas a chamada curiosa para a prática parece fugir um pouco desta agitação mental. Viva a curiosidade !
Abraço. RB

Anônimo disse...

We shall not cease from exploration
And the end of all our exploring
Will be to arrive where we started
And know the place for the first time.

Eliot, T. S., Four Quartets.

Lara disse...

Thiele, lendo um livro sobre história da filosofia Ocidental, no capítulo sobre Spinoza encontrei a idéia, que adiciono a seu bolo-blog.
A sensação cotidiana de sermos agentes livres é uma ilusão, porque quase nunca estamos conscientes das causas reais de nossos atos, a aquisição dessa consciência por meio da reflexão pode nos libertar, não no sentido de nos tornar literalmente livres, mas por oferecer compreensão e discernimento, com a possibilidade de nos dar conta das coisas tal como são.
Avançando, poderíamos contemplar nossas vidas sob o olhar da eternidade - sub specie aeternitatis.