segunda-feira, 3 de março de 2008

O trem e a bagagem

Neste último texto tivemos duas visitas ilustres nos comentários: T.S. Elliot e Spinoza... muito erudito este blog! Acho fantástico, espero que esta troca de visões e idéias esteja fazendo (algum) sentido para vocês.
Já dizia Ramana Maharshi, de modo um tanto simples, sobre a questão da ilusão da liberdade citada no comentário da Lara (Spinoza):

“Se você pega um trem porquê carregar sua bagabem pesada no colo? porquê não colocá-la no bagageiro, e deixar que o trem a leve?”
Neste caso o trem é uma analogia da vida em si mesma, do contínuo fluxo de Consciência que é o que existe, onde nós existimos e do qual não somos diferentes. Entretanto nós, do alto de nossa ignorância, assumimos como certo o fato de de termos controle sobre nosso caminho, e fazemos absoluta questão de continuar a carregar a bagagem pesada no colo. Assuminos como fato que somos separados e diferentes do próprio universo ao buscarmos a imposição de uma vontade pessoal.

Todas as linhas de busca tratam do tema ao explicar a experiência do desapego, do abrir mão, da entrega. Nesta analogia proposta por Ramana a entrega suprema parece tão simples: deixar o trem levar a bagagem e aproveitar a viagem!
Eis aí o que se busca afinal: a felicidade não está em tentar controlar o seu futuro através da sua vontade, mesmo que ao final se alcance a meta, mas descobrir a felicidade em cada instante de entrega à realidade. Abrir a janela do trem e sentir o vento no rosto.
Outro dia me dei conta de que vivo ainda sob a sombra de um aparente juízo final sobre a minha vida e meus atos. Herança sem dúvida de toda a história que vivi, do local em que nasci, do caldo de milênios em que brotei. Uma e outra e outra vez me dou conta e percebo a ilusoriedade que há nesta idéia de que há um “caminho certo” a seguir nesta vida, seja qual seja a dimensão a que nos refiramos.
Mas este final de semana em um pequeno momento me dei conta da sutileza da persistência deste conceito. Como uma tênue sombra ele permanece, como aquele interruptor que você só percebe ao não focalizá-lo no escuro. Como uma voz confortável e acolhedora, tão familiar... e tão ilusória.
Ali mesmo, escondida por trás desta idéia, está a esperança mais sutil e fundamental do “pequeno eu”, a esperança de existência e do controle.
O caminho está dado desde sempre, avante com passos largos! Sem espelho retrovisor e sem mapa, nosso livre arbítrio real é caminhar.

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