quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Poemas

Acho que já mostrei estes poemas de Fernando Pessoa (Alberto Caeiro) alguma vez no passado... mas, afinal, foi no passado. Vale a pena. Para aqueles que tem certa familiaridade com as questões que discutimos nos grupos de meditação vejam como estes versos são pílulas concentradas de alto impacto de filosofia da não dualidade. Divirtam-se.


O Universo

O universo não é uma idéia minha. 
A minha idéia do Universo é que é uma idéia minha. 
A noite não anoitece pelos meus olhos, 
A minha idéia da noite é que anoitece por meus olhos. 
Fora de eu pensar e de haver quaisquer pensamentos 
A noite anoitece concretamente 
E o fulgor das estrelas existe como se tivesse peso. 


Não Basta

Não basta abrir a janela 
Para ver os campos e o rio. 
Não é bastante não ser cego 
Para ver as árvores e as flores. 
É preciso também não ter filosofia nenhuma. 
Com filosofia não há árvores: há idéias apenas. 
Há só cada um de nós, como uma cave. 
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora; 
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse, 
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela. 

Assim Como

Assim como falham as palavras quando querem exprimir qualquer  pensamento,  
Assim falham os pensamentos quando querem exprimir qualquer realidade,  
Mas, como a realidade pensada não é a dita mas a pensada.  
Assim a mesma dita realidade existe, não o ser pensada.  
Assim tudo o que existe, simplesmente existe.  
O resto é uma espécie de sono que temos, infância da doença.  
Uma velhice que nos acompanha desde a infância da doença.  


O Espelho

O espelho reflecte certo; não erra porque não pensa. 
Pensar é essencialmente errar.     
Errar é essencialmente estar cego e surdo. 


Vive


Vive, dizes, no presente, 
Vive só no presente.
Mas eu não quero o presente, quero a realidade; 
Quero as cousas que existem, não o tempo que as mede.
O que é o presente? 
É uma cousa relativa ao passado e ao futuro. 
É uma cousa que existe em virtude de outras cousas existirem. 
Eu quero só a realidade, as cousas sem presente.
Não quero incluir o tempo no meu esquema. 
Não quero pensar nas cousas como presentes; quero pensar nelas  
                como cousas. 
Não quero separá-las de si-próprias, tratando-as por presentes.
Eu nem por reais as devia tratar. 
Eu não as devia tratar por nada.
Eu devia vê-las, apenas vê-las; 
Vê-las até não poder pensar nelas, 
Vê-las sem tempo, nem espaço, 
Ver podendo dispensar tudo menos o que se vê.  
É esta a ciência de ver, que não é nenhuma. 


abraços
marcos

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