quarta-feira, 3 de novembro de 2010

467.200 horas

Precisamos aprender a ouvir o som da atenção. Precisamos aprender a sentir a consistência firme de um estado de presença. A atenção é uma propriedade da Consciência, a propriedade que permite que tenhamos capacidade de cognição como indivíduos.
Sem atenção não perceberíamos coisa alguma, o fato de percebermos algo denota a existência da atenção. De verdade nunca estamos desatentos, pois a atenção sempre está; pode estar direcionada para algo que não seja o que ocorre no instante presente, e estaríamos desatentos ao que ocorre naquele instante, mas ainda assim atentos a alguma outra corrente de informações, como nossos devaneios, por exemplo.
A atenção está presente continuamente, segundo após segundo, um jorro incessante; desde o nascimento até a morte, a questão é:  o que fazemos com ela? para onde direcionamos este jorro ao longo de nossas 467.200 horas de vida (para uma vida de 80 anos, em vigília de 16 horas por dia)? Supondo que nos primeiros seis anos de vida estávamos mais presentes, e que talvez, por misericórdia ou sorte, em 5 minutos a cada hora estejamos realmente presentes (sendo bem bondoso na estimativa),  chegamos à conclusão que desperdiçamos 68 anos de vida em vigília em nossos devaneios... aleluia!
Imaginem a potência de 68 anos de hábitos de pensamento continuamente pisados e repisados! Assim se criam as tendências de nexo entre os ciclos de vida, assim se criam as condições kármicas, assim se perpetua a roda da ignorância.
Considerando que todos nós que lemos este texto ainda temos disponibilidade de atenção, há que se ter o senso de urgência de se perguntar o que realmente desejamos fazer com este fluxo incessante de vida e presença representado pela atenção.
Há que se aprender a escutar o som da atenção nas práticas de meditação interna, notar suas nuances, sua potência, sua volatilidade; há que se investigar a atenção trazendo-a para si mesma. Esta prática exercita e fortalece a capacidade de se perceber perdido em devaneios no dia a dia. Há que se estar pronto para, ao primeiro sinal de distração, trazer a atenção de volta para a realidade que se apresenta, uma e outra vez. A realidade, em seus múltiplos objetos que se sucedem no instante presente, puxa e demanda nossa atenção, temos apenas que deixar que o fluxo natural siga seu rumo, isto é, quando em ação no dia a dia a realidade é prioritária, não nossos devaneios. A atenção é demandada pelo presente que acontece, pelo mundo. A mente linear é que, ao gerar a ilusão da diferença, da individualidade criadora, puxa a atenção de volta para si mesma, para os devaneios eternos que dão a sensação de permanência a um “eu” impermanente. Há que se liberar o navegar no fluxo de atenção natural para buscar a cor real e não sua interpretação; o som que se ouve e não sua memória; o sabor do instante e não sua implicação futura. 


abraços
marcos

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