segunda-feira, 16 de maio de 2011

Senna, alpinismo e presença

Então onde está este bendito estado de presença de que tanto falamos? Parece uma criação mental, uma construção teórica para explicar algo que jamais conheceremos. Entretanto basta um pouco de atenção para percebermos que está logo aqui, logo agora.
Em muitos dos grupos de meditação aparece a dúvida sobre a presença. E em todos eles cada indivíduo consegue localizar experiências de presença mais profunda. Em nosso dia a dia é muito comum encontrarmos exemplos de pessoas que buscam situações extremas pela sensação que delas advêm. Vejamos dois exemplos.
Segue um trecho de uma entrevista de Ayrton Senna:
“...Mas passei por uma situação de risco muito maior na tomada de tempo para a corrida de de Mônaco em 1988. Eu já tinha a pole, mas continuava na pista. A cada volta aumentava a diferença para os outros pilotos. Eu estava me superando a cada volta e entrei em outra dimensão. Não via a pista, ela tinha virado um túnel. A distinção ente o homem e a máquina deixou de existir, me fundi com o carro, viramos a mesma coisa. Depois de cinco voltas, acordei para a situação de extremo perigo em que estava e fui para os boxes.”
E aqui um trecho de uma outra declaração de um alpinista, na Revista Brasileira de Psicologia do Esporte e do Exercício:  “ É uma coisa só... quando você chega a este nível é o êxtase.  É quando você consegue se dissolver. Quando você esquece totalmente do seu ego. Então você entra neste turbilhão... até chegar naquele pico... que é o de se entregar totalmente... porque não adianta, chega num ponto tal que você dilui.”
O risco de situações extremas faz com que todo a nossa atenção, todo o nosso sistema esteja atento e pronto para responder ao que se passa. Com a continuidade deste estado (como nos casos acima) a atenção se coloca mais intensamente no presente que se sucede, e cada vez menos no “eu”, no sujeito. Até um ponto em que a própria realidade é consciente do que se passa, sem a necessidade de um sujeito que se aproprie da idéia de consciência.  Assim um estado de consciência denominado observação, ou, mais profundamente, concentração, emerge. Nestes estados não há um “eu” personalístico que viva a situação, no entanto a ação que se produz é mais eficiente e mais inteligente, e a sensação é mais plena e mais viva. Quem produz a ação, quem vive a sensação? A própria realidade. 
O que ocorre é que no instante seguinte reaparace a agitação mental, reaparece um “eu” que pensa e se percebe de novo diferenciado da realidade mesma (como Senna retornando aos boxes), um “eu” que guarda na memória estas experiências e tentará de tudo para vivê-las novamente... embora este “eu  nunca as tenha vivido de fato.
Todos temos dons, ou vocações, que são tendências e qualidade naturais que trazemos em nosso sistema de corpo(s) + mente, como era por exemplo o automobilismo para Senna. Se compreendemos isto e buscamos atuar em nossas vidas de modo a utilizar e viver estas tendências de maneira intensa, nos será mais fácil aprender a reagir sem dúvidas ante à realidade nestes campos específicos. Isto porém é só o princípio. Depois poderemos experimentar como transbordar estas experiências do viver sem dúvida para os outros campos de nossas vidas, para o nosso dia a dia. 


Abraços,
Marcos

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