quarta-feira, 9 de junho de 2010

A renúncia à ação

Qual a natureza da renúncia à ação? É muito comum que em algum momento da vida ou da trilha de auto-conhecimento as pessoas se sintam com uma vontade de “deixar tudo”, buscar uma vida completamente diferente. Para algumas pessoas isto se reflete em um desejo de viver no campo, para outras de se instalar em um mosteiro.
Em uma escala menor o mesmo se dá quando uma pessoa decide que  não vai agir, mas permanecer passiva ante o que se passa, supostamente porque isto seria mais sábio do que “se misturar  com este mundo”.
É essa a base da ilusão da que uma pessoa “espiritualizada” apenas reage sorrindo com ares de incenso a tudo que ocorre. Muito provavelmente esta pessoa está de fato fugindo de sua natureza de ação no mundo, de seu próprio prarabdha karma, ou o karma desta existência individual neste ciclo específico.
Na Índia a renúncia à ação corresponde também a uma categoria ou natureza de pessoas chamados sannyasin; são aqueles que se vestem na cor de açafrão, monges renunciantes. Em tese na India antiga estas pessoas teriam deixado para trás as passagens anteriores desta vida, tendo cumprido suas obrigações e responsabilidades naturais que lhes tinham sido apresentadas (família, trabalho, etc.) e a partir de um certo momento renunciavam às posses materiais, e à ação.
Hoje esta visão está um tanto confusa.
Na raiz da renúncia de um sannyasin está algo muito mais profundo e de difícil compreensão para os ocidentais, que é o desapego mental aos objetos de sensação. Antes da renúncia à ação já está consolidado o desapego à própria idéia da ação, desapego do indivíduo pelo resultado desta ação, e, ao final, desapego da ação mesma.
Desta forma a renúncia verdadeira já ocorreu internamente antes mesmo que uma renúncia externa se faça evidente, e nesta situação não há qualquer tipo de dúvida ou angústia quanto à própria persepctiva da renúncia. Assim, se você em algum momento pondera a respeito de renunciar ou não a alguma coisa, saiba que ainda não está perto de estar pronto para a renúncia verdadeira. Neste momento o desejo da renúncia é apenas mais uma construção da personalidade.
A inação forçada originada de uma renúncia imatura gera tantas tendências futuras (karma) quanto a ação forçada (não natural, nascida da perspectiva do benefício do “eu”). Vivemos em um mundo de ação e temos responsabilidades conforme o ambiente e o nosso sistema desde que nascemos: nosso corpo, nosso entorno, nossas relações. A fuga da ação requerida pelo presente que nos é trazido a cada momento não é um caminho válido. Antes devemos aprender a reagir naturalmente a cada instante, e a partir daí o desenvolvimento do discernimento (viveka) pode nos levar a compreender a natureza da realidade, quando então o desapego mental pode ser forjado. Procurar inverter esta ordem natural do universo a partir de um desejo da personalidade traz apenas mais confusão. 
abraços
marcos

Nenhum comentário: